Resgate aos Bombeiros de Goiás

Em 1957, um grupo de 11 bravos e corajosos homens saiu de Goiás para aperfeiçoar-se na vizinha Minas Gerais. Até aí uma história comum até nos dias atuais, porém, aqueles jovens escreveram seus nomes na história goiana ao deixarem seu estado como cidadãos comuns e voltarem Bombeiros Militares; lá aprenderam as técnicas e a disciplina tão marcantes e admiradas por toda a sociedade; começava ali a história de uma das instituições mais respeitadas de Goiás. Respeito adquirido à duras penas, ao longo dos últimos 53 anos. Definitivamente, não é por acaso que muitos de nós, quando crianças, desejássemos ganhar um caminhãozinho de bombeiros de presente, daqueles com escadinha, mangueiras e tudo mais; também não é gratuito que grande parte das crianças tenha, em seu ingênuo planejamento, galgar cada degrau da longa escada que leva ao sonho de ser bombeiro.

Em 05 de outubro de 1989, a Constituição goiana emancipou a instituição que passou a ser independente da irmã Polícia Militar. Desde então, o Corpo de Bombeiros tem estado sempre presente entre os primeiros colocados em pesquisas de satisfação e reconhecimento por parte da população sobre os serviços públicos. Até aqui tudo maravilhoso, porém, grande parte das conquistas custou (e ainda custa) caro aos homens e mulheres que escolheram ali obter o sustento para as suas famílias. É inegável que muito se avançou em termos salariais e equipamentos, entretanto, é doloroso saber que, ainda hoje, (obstante a uma declaração recente do governador Marconi Perillo enfatizando a sua intenção de adotar jornadas de trabalho mais justas para o funcionalismo público estadual) se submeta estes bravos homens e mulheres a um regime mensal que pode chegar a absurdas 240 horas de trabalho. Para ter-se uma ideia, um trabalhador regido pela CLT, trabalhando 8 horas diárias, perfaz 160 horas mensais. Vale lembrar que este mesmo trabalhador, dito celetista, goza de adicional noturno e de insalubridade.

Na última semana, o Tribunal de Contas do Estado de Goiás emitiu um relatório de Auditoria Operacional (AOP) com o título-diagnóstico – Recursos insuficientes sobrecarregam efetivo dos bombeiros (disponível em: www.tce.go.gov.br) – no qual detectou e fez constar que “Os recursos financeiros, humanos, físicos e materiais do Corpo de Bombeiros Militar de Goiás são insuficientes para cumprir com efetividade a prevenção e atendimento a sinistros e emergências”. Em meio ao recente escândalo – crise na Polícia Militar, prisão de policiais pela Polícia Federal –, a Segurança Pública de Goiás parece não ter tido tempo para verificar a situação junto ao órgão pesquisado. Tampouco foram prestados esclarecimentos à imprensa ou à sociedade por parte da cúpula do órgão.

Enquanto isso, a principal vítima, segundo o TCE, é o “efetivo operacional dos bombeiros” – a saber efetivo, segundo o dicionário Michaellis, é aquele “que não tem interrupção; permanente”. Na realidade, ele representa aqueles que, de fato, vivem a profissão de bombeiro (dedicação integral), labor este que, como já foi dito é quase unanimemente aprovado pela população; o efetivo operacional, formado por homens e mulheres (a maioria chefes de família) é quem, de fato, sente na pele o que cada parágrafo do relatório do Tribunal quer dizer.

A AOP esmiuçou cada ponto citado anteriormente, porém, conferiu maior ênfase aos recursos físicos, materiais e humanos.

Nas palavras do TCE, “(...) foram encontrados os seguintes “achados” pela equipe de auditoria:

  • defasagem no número de médicos e ambulâncias de suporte avançado;
  • ausência de suporte avançado na unidade de Aparecida de Goiânia;
  • comunicação vulnerável entre o Corpo de Bombeiros e o Samu;
  • dificuldades para a participação de bombeiros em cursos de treinamento e capacitação;
  • falta de desfibrilizador nas ambulâncias de suporte básico;
  • ausência de local adequado para limpeza das ambulâncias e desinfecção dos materiais utilizados no resgate.

Até aqui já teríamos motivos de sobra para nos preocuparmos, vemos que, talvez, por meio de um autoritário controle de informações, muitos fatos – a maioria deles vitais para a tranqüilidade dos contribuintes goianos – têm sido maquiados ou, simplesmente, omitidos dos noticiários e da imprensa em geral. Por que razão nada disso é noticiado? Por que isto acontece? Estariam aqueles servidores públicos submetidos a algum tipo de cerceamento de suas liberdades individuais?

E a lista continua:

  • condições inadequadas de desinfecção de materiais e equipamentos no Hugo;
  • falta de registros dos projetos das instalações preventivas de incêndio, explosão, pânico e desastres, o que dificulta o cumprimento de prazos;
  • a renovação das vistorias não feitas tempestivamente, o que aumenta a possibilidade de ocorrências de incêndios;
  • e falta de criação dos órgãos responsáveis pela articulação e coordenação do sistema em nível municipal.

Em contato com vários profissionais que vestem aquela honrosa farda ouvimos relatos tristes e desmotivados de homens e mulheres que são submetidos a jornadas de trabalho extenuantes – acirradas por constantes desvios de função e convocações extraordinárias (aquelas realizadas em horário de folga) –, a condições precárias de trabalho – assepsia de materiais e viaturas em locais diversos àqueles sugeridos pelas entidades sanitárias –, além de inúmeros casos de assédio moral e abusos de autoridade por parte de superiores hierárquicos. O Relatório resume a deplorável situação dos recursos humanos do órgão da seguinte forma: “foi observada insuficiência na quantidade de bombeiros ativos, sobrecarregando o trabalho e comprometendo a saúde física e mental do efetivo, além de acarretar sérias consequências para a população, por se tratar de um serviço que envolve ações de urgência e perícia”.

Não resta dúvida que os relatos citados mostram que a situação é grave. Para termos uma ideia, o bombeiro que trabalha no setor operacional – responsável por combate a incêndio, salvamentos diversos e atividades de defesa civil – trabalha cerca de 240 horas mensais, sendo empregado em situações de extremo risco e responsabilidade. Por outro lado, um policial civil, em regime de plantão, trabalha cerca de 160 horas mensais; o policial militar, também em regime de plantão, trabalha 180 horas mensais; finalmente, os bombeiros que trabalham em regime de expediente são submetidos a uma jornada diária de 08 horas – 144 horas mensais e de absurdas 120 horas mensais (06 horas diárias) no caso de determinadas funções administrativas.

Os números deixam clara a ocorrência de uma distinção, em termos de horas trabalhadas, absolutamente gritante (de até 100%) entre servidores pertencentes à mesma secretaria – SSP-GO –, bem como entre aqueles pertencentes ao mesmo órgão – CBM-GO.

Parece inegável que haja sobrecarga física e mental dos homens e mulheres que exercem o serviço operacional do Corpo de Bombeiros Militar do Estado de Goiás, infelizmente, o assunto é desconhecido para a maioria da população e grande parte das autoridades políticas e jurisdicionais; além de ser potencialmente perigoso para todos nós, afinal, o esgotamento físico e mental destes “anjos” comprometem, diretamente, a segurança pública e a tranquilidade da população goiana. Com a palavra, o comando da instituição.


Pedro de Alcântara Xavier de Paula

Um comentário:

  1. Olá senhor Deputado Major Araujo, o referido texto, me fez ver um filme de meu proprio cenario de trabalho, pois sou soldado do corpo de bombeiros militar do Estado de Goias e trabalho na região do entorno, faço parte da equipe de APH (UNIDADE DE RESGATE "AMBULANCIA"). E varias vezes fui obrigado a lavar a viatura suja de sangue humano apenas com agua e vassoura, pois muitas vezes, no quartel não tem nem sabão, muito menos alcool 70% ou agua sanitaria. a população vê uma UR que é bonita por fora, porem por dentro, um completo descaso em se tratando de material.

    ResponderExcluir